2/23/2006

Música independente em discussão

Recife - Mais uma vez Recife desponta como vanguarda no meio musical. Pelo segundo ano consecutivo, a poucos dias do Carnaval, um evento chamado Porto Musical reúne produtores, artistas, donos de selos, promotores de festivais, jornalistas e uma comunidade interessada em discutir, aprender e ver como anda o universo da música. Durante três dias de evento, que terminou na última quarta-feira, 34 palestrantes apresentaram novidades, projetos, idéias e apontaram perspectivas para as mais de 400 pessoas inscritas.

Realizado com apoio de entidades públicas e em parceria com o Womex, o evento vem se solidificando como principal ponto de discussão sobre o mercado de música no país. Segundo Paulo André, organizador do evento, a idéia do porto musical é aproximar mercados e oe network ligado a música. “Aqui no Nordeste a gente é muito carente desse tipo de coisa e mesmo no Brasil todo não tem um evento assim que tenha essas três plataformas focando os internacionais interessados nos brasileiros, os brasileiros interessados no mercado internacional e a discussão da música e da tecnologia”, disse.

Paulo André, que também é o responsável por um dos principais festivais de música do país, o Abril Pro Rock, avalia o Porto Musical como uma excelente oportunidade para o aprendizado de profissionais ligado ao universo da música. “Eu considero um curso de algumas horas com vários professores colocados no mundo inteiro que fazem o mercado e falam sobre esse mercado. Mas não adianta vir participar sem estar preparado, tem que ter um material decente, o mercado exige profissionalismo”, afirma. Entre esses professores nomes como Alex Webb, responsável pela rádio BBC 3 de Londres; Gerald Seligman, diretor da Womex, uma das maiores convenções internacionais de tendências musicais; Sérgio Sá Leitão, assessor do Ministério da Cultura; Marc Benaiche, diretor do Mondomix Media; Jean-François Michel, secretário geral do European Music Office (EMO), entre tantos outros.

É buscando o aprendizado com essas pessoas que alguns produtores baianos marcaram presença no evento. Do ano passado para esse, a participação mais do que dobrou, com o comparecimento de artistas como Rebeca Matta, integrantes da banda tara_code, além de produtores independentes. “O PortoMusical é um espaço importante para estabelecimento de contatos e conhecimento de diversas ações e iniciativas que estão sendo realizadas tanto no Brasil como em outros países. Gostei muito do evento pois encaixou muito bem com a demanda que jovens produtores independentes estão tendo de articulação entre si”, afirma Jamile Vasconcelos, produtora baiana.

Experiências e discussões

Durante as cerca de seis horas diárias de discussões, que finalizavam com apresentação de shows abertos para o público (com bandas locais, nacionais e internacionais), foram abordados temas diversos. Desde a apresentação de projetos bem sucedidos, como o Overmundo do sociólogo Hermano Vianna, até discussões mais subjetivas sobre conteúdo digital sob demanda. Estiveram em pauta, entre outros, a história do sampler, a relação entre gravadoras e telefonia móvel, a importância do Mangue Beat, a exportação da música brasileira, o futuro da música independente, convergência digital, os selos e festivais independentes, além da apresentação, pelo Ministro Gilberto Gil, da Copa da Cultura, que levará este ano artistas brasileiros para a Alemanha.

Com foco claro no mercado independente, o Porto Musical, acaba apontando tendências e mostrando caminhos para artistas fora da grande indústria. “É um pecado dizer que no Brasil a cena musical não se renova. Ela se renova, só que não encontra espaço. DJ Dolores, por exemplo, toca em 10 países da Europa, nos Estados Unidos e nunca tocou em João Pessoa, que é aqui do lado”, afirma Paulo André. Segundo ele, esse fortalecimento dos independentes não é exclusividade do Brasil, no exterior também isso vem acontecendo. Aqui no Brasil, grandes medalhões como Gal Costa, Milton Nascimento, Chico Buarque, entre tantos outros, já optaram por esse meio. O Rei Roberto Carlos criou um selo próprio. Sinal dos tempos.

Shows
A cad anoite o Porto Musical era fechado por interessantes shows. Misturas de sons, nacionalidades e propostas. Shows como da pernambucana Isaar (ex-Comadre Fulozinha e atualmente acompanhando DJ Dolores na Aparelhagem), que faz um passeio por ritmos como carimbó, maracatu, entre outros. Os portugueses The Gift, uma das principais atrações, mostraram um trabalho que flerta com o Trip Hop e sons dos anos 80, algo como se Morcheeba encontra-se o Erasure. Com desnecessárias letras em inglês, valeu pela bela voz da vocalista e pela insólita versão de "Ìndios", do Legião Urbana. O La Pupuña, de Belém, mostrou porque é uma das maiores apostas do meio independente, com um som calcado nos ritmos paraenses como Carimbó e Guitarrada, pega um pouco de suf music e promove uma interessante festa. O local Erasto Vasconcelos também reza na cartilha dos sons regionais pernambucanos, mas o show cansou um pouco. Falando em mistura o Think of One da Bélgica mostrou uma influência direta do Mangue Beat. Pegam frevo, maracatu, reprocessam com guitarras, sintetizadores, utilizam tambpém muito sopro e criam uma sonoridade nova, que com a participação de Sila do Côco fez do show o melhor do evento.
Como Recife é a terra dos festivais, em paralelo ao Porto Musical acontecia o Pre-Amp. Destaque para o show do Parafusa, band alocal, que vem crescendo e promete como uma boa aposta para 2006, rock, com toques de música braisileira, frevo e muita qualidade. Mas quem roubou a cena foram os veteranos da Mundo LIvre S/A. A banda ganhou uma carga nova com a mudança de integrantes. O show tá bastante punk, com direito a cover de The Clash e a mistura mais bem dosada de guitarras e cavaquinho que o mundo já viu. Com um EP novo lançado por selo próprio, a banda aposta na venda direta em show, sem lojista, internet ou qualque ou outra coisa como intermediário. É também uma aposta para tornar os shows mais interessantes. Ousadia que merece ser aocmpanhada.