2/05/2004

Festival de Verão
Não é lá os festivais do sonhos, mas sempre tem uns acertos, trazendo bandas e artistas interessantes. Esse ano acho que foi o mais ousado, não tanto por abandonar o modelo de muito público, muito dinheiro e gravadoras se dando bem (não fizeram isso), mas com o Axé em baixa, foi o rock que ganhou espaço. Não fui todos os dias, na quarta e quinta só o que me interessava mesmo era Skank, com o show do novo disco que dizem foi muito bom, e Los Hermanos, com o show de Ventura, que eu não acho muito adequado para um espaço tão grande e pelo que soube não foi sensacional como os outros shows deles por aqui. Nos outros dias pude ver bons shows e a prova que Salvador jé é outra, falta neguinho acreditar (alguns já estão):
Sexta-feira - Era considerado o dia do rock do festival, sem dúvida juntando tudo era o melhor dia que o festival já teve em sua história. Mais, era a primeira vez que não havia uma atração baiana do axé ou pagode. Tudo bem, vocês vão falar em Carlinhos Brown. Podem até falar mal (eu não falo), mas ele está longe de fazer axé e pagode nem se fala. Vamos ao que importou.
A chuva resolveu aparecer, para muitos num sinal que São Pedro não gosta de rock, mas parecia um teste definitivo. Vamos ver até onde vão esses roqueiros. E que teste. Foram horas de dilúvio e mais de 30 mil pessoas permanecendo para ver um dia daqueles. Histórico.
No Palco Pop, as bandas do cenário rock baiano finalmente tiveram seu espaço. Tudo bem que o acanhado palco, tinha um som bem ruim, mas serviu como teste, vamos ver nos próximos anos. A surpresa foi o sucesso da Brinde para um público de adolescentes sedentos por HC, Metal e barulho. A Brinde fez um grande show com seus hits (pelo menos pra quem conhece a banda) e saiu aclamada. A Dr. Cascadura também agradou, especialmente por tocar Queen of the Stone Age e Foo Fighters. Já Nancyta e Os Grazzers foi meio estranho. Esperava que aquele público que curte coisas mais pesadas recebesse melhor a banda. Na segunda música, Nancy convocou Pitty para o palco e deu pra se ter uma noção do enorme público que a revelação de 2003 por grande parte da imprensa nacional tem. Nancyta fez um show um pouco inferior ao que faz normalmente, mas deu para dar o recado que há alternativa na música baiana.
O Palco Principal recebia a que já foi chamada rainha do rock. Rita Lee sabe fazer um show e viu que o dia era rock´n roll. Deixou um pouco de lado os sucessos mais românticos (claro que teve "Doce Vampiro", mas "Mania de Você", por exemplo não rolou) e tascou rock. Seus sucessos dos anos 80 mais rock, música dos Mutantes ("Top Top") e uma cover surpreendente de "I Wanna be Sedated", do (Ramones, com a paulista jogando os cabelos na cara e se fazendo de Marky Ramone.
A chuva (um dilúvio na verdade) caiu de vez mesmo a partir do meio do show do Paralamas. Foi aliás quando comecei a assistir o show e quando esquentou de fato. Vários hits e todo mundo pulando. Divertido.
Parece que era mesmo um teste tanta água no show do Sepultura. Segundo o organizador do evento, Maurício Magalhães, ao ser perguntado como ele avaliava a noite rock, respondeu: "Foi uma noite pesada".
Isso porque ninguém contava com a chuva e subestimavam a detonação que o pessoal do Sepultura faz. A banda não comeu nada de água na cara e fez um show FODA, não tem outra palavra. Peso, muito peso. Tanto que ajudaram a derrubar uma torre com um telão ao lado do palco. A própria produção do festival admitiu que o som do Sepultura contribuiu. ROCK!!! lml. E o que foi aquele final com "Bullet the Blues Sky" e mais ainda "Roots Bloody Roots"? Impressionante.
Pena que o show de Marcelo D2 teve que ser cancelado, lamentavelmente sem nenhum esclarecimento da produção ao público. Um novo show de D2 está marcado para o dia 7 de março, na Área Verde do Othon.
Sábado - Dia bem estranho, com misturas bem indigestas, mas dava para assistir algumas coisas e se surpreender com outras. Não vi quase nada do show de Margareth Menezes, mas ela é unanimidade entre os que não gostam de axé ocmo a pessoas que faz o Carnaval ainda ter graça. Só deu pra ouvir alguns bons momentos, como quando cantou o sucesso "Dandalunda", fez versão de "É Hoje" e recebeu a bateria da Mangueira e Alcione. O show seguinte foi do Cidade Negra, uma das bandas que acho mais sem graça, apesar de não ser totalmente ruim. Tive sorte, como tocam aqui várias vezes no verão, resolveram sair da mesmice e tocar um repertório especial, segundo eles homenageando o reggae. Foi bem bacana. Tocaram Edson Gomes, Led Zeppelin, Legião, Peter Tosh, Paralamas, Bob Marley e por ai vai.
O samba tomou de assalto o Parque de Exposições. Agradando roqueiros, pagodeiros, axezeiros, ripongas, maconheiros, playboys, pats. Zeca Pagodinho fez um show sensacional. Como se estivesse no quintal de casa levou seus sambas e o gigantesco público a balançar no mais brasileiro dos ritmos. Lindo. Foi legal, mas até dispensável a presença de Gil, Caetano e Daniela Mercury no palco. Zeca é um boa praça.
Apesar disso tudo um dos shows mais esperados do festival viria a seguir. Camisa de Vênus. A banda é uma lenda, copiou músicas dos outros, criticou meio mundo, criou problemas com gravadoras e a censura, provocou polêmicas e se mantém no espírito rock´n´roll. Quem foi e gostou do show de Marcelo Nova meses atrás, não se decepcionou. Foi mais ou menos aquilo, com os dois guitarristas originais e o velho Marcelo Nova mostrando como ser um show-man do rock. O cara sabe como fazer e dá-lhe "Bete Morreu","Silvia", e "Joana D´Arc" e tantos outros hits certeiros. Não parecia anos 80, parecia mesmo um bando de roqueiros velhos fazendo rock no século XXI, mas bem feito e no talo. Massa!
Domingo
Outra grata surpresa do festival foi Daniela Mercury. Sim, pode ler de novo. Pra começar Daniela Mercury resolveu chutar o pau da barraca e lançou uma pista do que vai ser seu novo disco. Eletrônica acima de tudo. Botou a banda nos lados do palco e abriu espaço para quatro DJs (Memê, Ramilson Maia, Zé Pedro e Xerxes). Com a maioria das bases eletrônicas, Daniela deu um bom susto na platéia acostumada com Axé. Chegou a dizer que música para Carnaval faz há 20 anos, queria mesmo era abrir novos caminhos. E para quem foi considerada rainha do axé, ela está mesmo disposta, misturando samba reggae, tecno, drum´n bass, música afro e muita coragem, fez um dos melhores shows do festival, com um repertório que inclui sucessos prórprios reprogramados e regravações, como "Tonga da Mironga" (de Vinícius e Toquinho). O choro quase no fim do show e o discurso de alívio foi uma mostra de que ela está disposta a abrir mão do certo e está apostando a carreira pela liberdade de criar, como todo artista deveria fazer (e ela mesmo fez questão de frisar no palco). O Rappa entreou no palco como a grande atração da noite, mas fez um show morno, talvez pelo público ainda não conhecer o disco novo, mas o fato é que não era dia da banda. Já tiveram melhores.
Pitty era meio uma incógnita para quem não viu a moça estraçalhar os ouvidos da gurizada nos dois shows que fez em Salvador. Já era bem tarde, mas a casa tava cheia para ver a baiana que tem mostrado como é o rock na Bahia. Ela não se fez de rogada e provou para os que ainda torcem o nariz que faz um trabalho ao vivo muito bom (melhor que no disco). Além dos hits que agitaram a moçada, lançou covers dignos do Nirvana, Alice in Chains e Chico Buarque. Foda era ver duas meninas de não mais de 10 anos ao lado desse que vos fala com 29 anos anos e uma amiga da mesma idade. Todos dançando sem distinção de nada e curtindo o bom e velho rock´n roll que teima em viver num lugar que há bem pouco tempos atrás era apenas prévia do carnaval do axé baiano. Sinal dos tempos.